Quase virei ateu. Sério. Isso não é somente uma figura de linguagem ou um título para chamar a atenção. Provavelmente você está agora se perguntando: “como sou capaz de ler o texto de alguém assim?”. Espero que, ao terminar a leitura, a gente se entenda melhor.
Abro parênteses: não tenho medo de me expor. Aprendi a não ser um pseudoperfil de perfeição espiritual, mas somente um menino que brinca com a possibilidade e o dom que Cristo me deu de escrever e pregar para falar sobre o mesmo Cristo que conheci, seja em momentos de angústia, seja de alegria. Sou a mesma coisa, tanto no blog e no dia a dia quanto no púlpito. Fecha parênteses.
Sendo assim, quero compartilhar algumas coisas que vivenciei no meu momento de crise de fé.
A primeira coisa que aprendi: não se pode falar sobre isso para qualquer um. Não dá. A Igreja não está preparada para ouvir que a sua mensagem está descontextualizada, incoerente e sem diálogo com a realidade; que não fala mais ao coração de muita gente e, quando fala, é sobre pouca coisa. Você tem de escolher muito bem com quem falará sobre suas crises para evitar conselhos genéricos, julgamentos precoces e gente que não quer te ajudar, mas somente apontar as falhas que enxerga em você. Tome cuidado, pois, nessa hora, a única coisa que você não precisa é que desconfiem de você. O necessário, nesse momento, é um abraço e uma oração sem muita santidade, mas cheia de verdade, como nos salmos de angústia.
A segunda coisa: você deve ressignificar os jargões. Sim, simplesmente ouvir “Deus sabe de todas as coisas” não ajuda muito. Então, você que geralmente serve de conselheiro para pessoas em crise, busque respostas que digam a mesma coisa (transmitam o mesmo recado), mas fora dos jargões. Você que está em crise, saiba que a maioria desses jargões pessoais de sua vida é teologicamente coerente, biblicamente fundamentada etc. Mas saiba também que a repetição dessas frases sem nenhum significado real para o seu coração nada mais se torna do que uma confissão positiva, quando você afirma aquilo que está fora da realidade e passa a acreditar por mera aprovação social. Sendo assim, tenha coragem de reavaliar esses conceitos e de, talvez, abrir mão deles e caminhar em uma fé que tenha muito mais convicção do que certeza. A certeza é uma verdade aplicável a todos; a convicção é algo do seu coração em contato direto com o Pai.
Apegue-se às suas convicções. Sim, isso ajuda muito. Apegue-se às convicções da fé que você professa. No meu momento de crise, não consegui me declarar ateu somente pelo fato de Jesus ser uma realidade manifestada para mim. Consigo abrir mão de um Deus que pune, que pesa a mão sobre o pecador, que exige vestimenta, jeito de falar e tudo mais; pois esse se parece mais com um tirano. É esse um tipo de deus que o ateísmo ataca. No que tange a Jesus, nada em Cristo é incoerente. Parece-me simples: Ele confronta o meu pecado com graça e amor, chama-me para caminhar junto (independente de orientação sexual, cor de pele, nível socioeconômico). Dessa fé eu não consigo abrir mão. Não dá pra não conhecer esse Jesus real, cheio de graça, verdade e amor, e, ainda assim, preferir as regras déspotas da instituição fria e mercenária que só visa ao lucro e à propagação da visão que ela professa.
Viva sua crise com intensidade. É sério mesmo. Viva a crise com intensidade. Assuma que está em crise, pense no que isso pode implicar, chore, grite, relaxe e volte a chorar. Estar em crise é algo constante na Bíblia. Vejo o ministério de Cristo e vejo os discípulos em profundas crises. Paulo tem divagações (pensamentos de cunho um pouco mais “filosófico” a todo instante) e está em crise a todo momento. Isso também acontece com Moisés, os salmistas e a Igreja Primitiva. A crise é parte da construção de um caráter coerente com a Escritura. Estar em crise não é pecado e é nesse momento que percebemos no que realmente cremos e como realmente vivemos o que acreditamos. É durante as crises que a vida de oração assume ou não papel primordial. É durante a crise que a leitura da palavra se torna ou não um bom parâmetro de vida, de orientação e de sondagem do coração. Só uma boa crise rega a fé genuína no Jesus da vida real.
Terceiro ponto: Reveja sua teoria. Essa é a parte que eu mais gosto. Já achei que definia todas as coisas sobre mim e que o desejo de ser salvo era o suficiente para o ser. Já achei o inverso, que Deus era quem decidia tudo. Já fui pentecostal. Já fui tradicionalista. Já acreditei nas teologias da vida contemporânea e também já duvidei delas por ter percebido que elas não chegam a lugar nenhum. A cada nova crise, vou percebendo uma coisa só: teologia é algo que se constrói e se segue construindo. Essa de que se está certo e o outro errado é bem desconfiável. Quem descobre algo muito novo geralmente tem um bom toque de heresia — vide as novas “unções” em que muitos surgem à base das “revelações” a cada dia. Reveja a sua teoria. Estude. Recicle o seu ensino. Erro é estar ultrapassado na transmissão dos conceitos que afirmam nossa fé. Crer é pensar. E pensar requer conteúdo que se adquire estudando.
A minha crise não passou e louvo a Deus por isso, pois não sou uma espécie atual de “ungidão” pós-moderno. Creio que essa crise servirá para que eu dê a devida atenção às práticas devocionais, disciplinas espirituais, entre outras coisas. Só não quero vivenciar, cada vez que a minha fé for colocada à prova no meu coração, um momento solitário, mas sim um momento em que a amizade, o amor e a oração de amigos que me olham nos olhos trarão à tona a bênção prometida para aqueles que vivem em comunhão (Salmo 133).
Não são vocês que precisam de mim. Eu preciso de vocês. Que isso fique claro a partir de então. Um grande abraço e que caminhemos juntos para a Cruz, onde a humanidade encontra redenção e fé, em nome de Jesus!
Em amor e lágrimas.
Autor: Mateus Machado
Um bobão prodígio, que brinca com as palavras ou usa da palavra para fazer brincadeira. Um maltrapilho orgulhoso ou orgulhoso humilhado. Alguém que Deus insiste em chamar como filho.
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